terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A velha da rua Porto Alegre


A velha da rua Porto Alegre

corpo flácido e olhar frio
tão seca de vida quanto tua casa sugere
a fachada tão abandonada de cuidados quanto a casca que a dona carrega.
Ao vê-la fica claro que alí nada mais existe
apenas rasteja o corpo molemente pelas calçadas
e vidas alheias
O único momento em que a velha se enche de vida é quando fala da dos outros
Lampir
Seus olhos até então frios sobressaem as rugas
e essas por alguns momentos parecem dar espaço a uma pele alva
mas logo a coisa muda
é tamanha a empolgação da velha
que seus musculos faciais trabalham loucamente
a cada palavra cuspida com gosto
sua pele quando a empolgação é grande
quase parece imitar um acordeão
das rugas à pele finamente fixada ao cranio
e quando esses momentos são longos
tem se a impressão
caso você olhe bem
que a pele da face cansada desse exercico se contrai
treme
e parece querer se soltar dos musculos
O corpo contrariando o intenso movimento do rosto
só sofre pequenos espasmos
que são quase previsiveis
a voz que nada tem de bonita
fica fraca e ai vem um espasmo
e logo a voz volta a irritação convencional
Os espasmos são curtos e precedem um suspiro longo
longo e intenso
consegue-se perceber se olhar bem
que durante esses suspiros
a fragil caixa toraxica da mulher se enche
rapidamente salientando seus seios murchos
e logo se esvai bruscamente
é um suspiro estranho
arranhado
rasgado
frio
Certa vez me pareceu o mesmo suspiro cadavérico
que soltam os suicidas que se enforcam
quando lhe soltam a corda que lhe sustenta o peso
e lhes fecha a traquéia
e o ar preso nos pulmões saltam
pelos lábios
sem vida e sem cor
...
É do tipo que reza
reza... mastiga a biblia, engole jesus
e cospe junto a obscenidades
não vai a igreja
mas faz novena para qualquer santo
que as vizinhas escolhem
cultus
é nessas ocasiões que consegue informação
sobre velhas vizinhas e suas familias
velhas histórias
...
são muitas as coisas irritantes
nessa velha mentecapta
além das já ditas
a forma como busca da porta de sua casa
alguem com quem falar
ou
sobre quem falar
os olhos se arregalam
e
se fecham de leve
como que ajustando o foco
de sua visão cansada
(caecus)
sua risada que se assemelha
a das prostitutas da Liberdade
que trocam a volupia pelo alccol
quando o movimento é fraco
e saem rindo
(de sí mesmas)
A expressão de satisfação
que lhe enche o rosto
quando chega com alguma novidade trágica
a satisfação que sente
em comunicar
os divorcios
brigas
doenças
e principalmente as mortes
essa satisfação morbida
(perdítio)
Porem
mais que seus olhos curiosos
que sua risada libertina
ou seu prazer na morte
A VOZ
DEUS
sua voz é horripilante
quase que multante
oscila entre a fraca voz dos moribundos
à forte voz de desespero
A vezes fala baixo
para criar certa áuera de sofreguidão
quando vai anunciar a morte
por exemplo
mas sua voz vai tomando força
quase que por sí só
e no fim de seu pronunciamento
está vociferando freneticamente
e como quase sempre acontece está aos gritos
com um sorriso frio no rosto
percebe que seu prazer na noticia tranpõe sua voz
percebe com certa alegria
os olhares assustados dos ouvintes
leva a mão ao rosto
suspira
imita um choro
diz com a voz mais proxima de doce
que com esforço quase consegue fazer:
- "mea maxima culpa"
os ouvintes desmancham a cara de horror
com esforço e por piedade
mas no fundo tremem diante da figura
velha bruxa
Todos a recebem
com muito medo e pouco interesse
sabem que tê-la como inimiga é perigoso
sabem que ela joga baixo
e quando a enfrentam
sabem que a velha fragil
vestido florido
invoca uma força demoniaca
de teu ventre
teu corpo se torna forte
até a postura muda
adquiri um angulo magestal
seus olhos quase soltam as orbitas
enquanto gesticula nervosamente
ameaçando
seus braços com o ódio
duas maça
GRITA!
e sua voz nesse momento é somente
forte
firme
assustadora
Vociferando
palavras sem sentido
gruni
nada explica
mas todos entendem
se calam
de certa forma se conformam
e alguns até fingem certa afeição
mas o fazem com olhar atônito
com medo
...

Quantas mortes mais iram ser proferidas por aquela lingua cansada?
Isso ninguem sabe e ninguem deseja muito saber
o que todos anceiam descobrir
é quando chegará a morte que a velha não poderá exclamar
quando aquela voz irá se calar
para que todos possam
em coro proclamar a morte
velha cobra
gritarem frenéticamente
dançando
rindo
celebrando
a morte de uma língua
e poderem se calar
finalmente aproveitar o silêncio
que sem a velha por perto com certeza irá durar décadas.

...

Thiago Henrique

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